sábado, 14 de setembro de 2013

Lítio e estimulação cognitiva aumentam neurogênese

Por Valéria Dias - valdias@usp.br
Publicado em 6/setembro/2013 | Editoria : Saúde | Imprimir      
Tratamento pode potencializar sobrevivência de novas células geradas no cérebro
O tratamento combinado entre lítio e enriquecimento ambiental (estimulação cognitiva e física) pode potencializar a sobrevivência de novas células geradas no cérebro de animais adultos, como mostra pesquisa do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP). “O tratamento combinado poderia constituir uma estratégia mais eficaz para promover a sobrevivência de novos neurônios e melhorar a função cognitiva na doença de Alzheimer. Porém, como o estudo foi realizado em animais adultos saudáveis, é necessário realizar pesquisa adicional para avaliar com mais clareza as implicações desses resultados”, aponta a psicóloga Evelin Lisete Schaeffer, coordenadora e idealizadora do projeto.
O lítio é utilizado como estabilizador do humor no tratamento do transtorno afetivo bipolar. Já o enriquecimento ambiental com estimulação cognitiva e física significa proporcionar um ambiente mais estimulante com oportunidade para desafios físicos e mentais.
“Em pesquisa com animais, um ambiente enriquecido com elementos de estimulação física e cognitiva consiste de uma gaiola que pode conter rodas de corrida, escadas, gangorra, tubos de plástico coloridos conectados para formar túneis, e brinquedos como bolinhas de borracha e pequenos objetos de madeira de diferentes formas e cores”, descreve Evelin. “Esses elementos são reorganizados e renovados em geral a cada dia para estimular o comportamento exploratório dos animais”.
“Para seres humanos, representa engajamento regular na prática de exercícios físicos e envolvimento contínuo em atividades cognitivamente estimuladoras, como assistir à televisão, ouvir música, ler jornais, revistas e livros, jogar cartas e xadrez, desafiar palavras-cruzadas e quebra-cabeças, e interessar-se por artes, ao longo da vida”, declara.
Neurogênese no hipocampoO objetivo do estudo foi avaliar se o tratamento de camundongos adultos com uma combinação de lítio e ambiente enriquecido com estímulos físicos e cognitivos poderia ter um efeito potencializador sobre a neurogênese no hipocampo. Neurogênese é o processo de formação de novos neurônios a partir de células-tronco residentes no próprio cérebro. Hipocampo é uma estrutura cerebral envolvida nas funções cognitivas de aprendizado e memória, que por sua vez são prejudicadas com o envelhecimento cerebral e a doença de Alzheimer. “A neurogênese é profundamente reduzida com o envelhecimento do cérebro e não parece suficiente para reparar a perda de neurônios em condições neurodegenerativas como a doença de Alzheimer, conforme demonstrado em animais de laboratório”, diz a cientista.
“Já se sabe que prática de atividade física, exposição a objetos que estimulam a atividade cerebral cognitiva, e alguns fármacos como antidepressivos e lítio são capazes de aumentar a produção e a sobrevivência de novos neurônios no cérebro de animais adultos e velhos, inclusive em alguns modelos animais de doenças neurodegenerativas”, conta.
Experimento
Camundongos adultos receberam injeções na cavidade abdominal com um marcador de novas células em divisão. Eles foram separados em 4 grupos: os mantidos em gaiolas padrão e tratados com ração padrão de laboratório; os mantidos em gaiolas padrão e tratados com ração enriquecida com lítio; os expostos a um ambiente enriquecido com estímulos físicos e cognitivos e tratados com ração padrão; e os expostos a um ambiente enriquecido e tratados com ração contendo lítio.
Após 4 semanas de tratamento, a análise do cérebro dos animais revelou que aqueles que receberam o tratamento combinado tiveram um aumento significativamente maior da taxa de sobrevivência de novas células geradas no hipocampo, em comparação à soma dos efeitos produzidos pelo tratamento isolado apenas com lítio ou com o ambiente enriquecido. Portanto, houve um efeito de interação, e não um efeito aditivo, entre lítio e ambiente enriquecido.
Para Evelin, pesquisas futuras poderiam investigar o efeito de interação entre lítio e ambiente enriquecido na neurogênese e memória em modelos animais transgênicos para a doença de Alzheimer, e no desempenho cognitivo de idosos com a doença em estágio inicial e com comprometimento cognitivo leve, que podem evoluir para Alzheimer.
Além de Evelin também participam do projeto o professor Wagner Farid Gattaz e os bolsistas de Iniciação Científica Fabiana Gadotti Cerulli e Hélio Oliveira Ximenes de Souza, do Laboratório de Neurociências (LIM-27) do IPq, além do colaborador Sergio Catanozi, do Laboratório de Lípides (LIM-10) da Divisão de Endocrinologia e Metabolismo do HC.
O projeto Efeito combinado de lítio e enriquecimento ambiental sobre a sobrevivência de novas células no hipocampo de camundongos adultostem apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
A pesquisa foi uma das ganhadoras do “Prêmio Lundbeck de incentivo à Pesquisa”, recebido pela aluna Fabiana Gadotti Cerulli. A estudante foi contemplada com um pacote para participação no “II World Congress on Brain, Behavior and Emotions” que ocorrerá em abril de 2014, em Montreal, Canadá.
Imagem: Wikimedia
Mais informações: email schaffer@usp.br, com Evelin Schaeffer

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Estudo aponta possível ligação entre cobre e mal de Alzheimer

Mineral facilitaria acúmulo de placas que causam a doença nos neurônios.
Mecanismo descrito na 'PNAS', contudo, é questionado por outros cientistas.

           

Da AFP
 

Exemplos de partes de tubulação de cobre' (Foto: Törsten Bätge/Creative Commons)Exemplos de partes de tubulação de cobre
(Foto: Törsten Bätge/Creative Commons)
Cientistas publicaram novas evidências de que o cobre pode provocar o depósito de placas no cérebro que causam o Mal de Alzheimer, alimentando novos debates sobre o papel deste mineral nesta doença degenerativa.
A comunidade científica está dividida sobre a questão de se o cobre - encontrado na carne vermelha, em legumes, laticínios e dutos usados para canalizar água potável em grande parte dos países em desenvolvimento - causa ou evita o mal de Alzheimer.
No mais recente estudo publicado no periódico "Proceedings of the National Academy of Sciences", os cientistas observaram como o cobre nos vasos sanguíneos pode causar um colapso na barreira sangue-cérebro (sistema que controla o que sai e o que entra do órgão), levando a um depósito da proteína beta-amiloide, placas que são a "marca registrada" do mal de Alzheimer.
De acordo com o principal autor do estudo, Rashid Deane, professor da Universidade do Centro Médico de Rochester, experimentos usando células de cobaias e humanas demonstraram que níveis baixos de cobre liberados através da água potável se acumularam nas paredes capilares que levam sangue para o cérebro.
"São níveis muito baixos de cobre, equivalentes ao que as pessoas consumiriam em uma dieta normal", disse Deane. O cobre provocou uma oxidação que interferiu em outra proteína, denominada proteína-1 relacionada a receptor de lipoproteína (LRP1), que normalmente removeria as beta-amiloides do cérebro, destacou este estudo.
Não apenas o cobre pareceu evitar a desobstrução das placas que acredita-se que sejam a principal responsável pelo mal de Alzheimer, como também estimulou os neurônios a produzir mais beta-amiloides.
Em um comunicado à imprensa, os cientistas descreveram suas descobertas como um "golpe duplo", que "fornece fortes evidências de que o cobre tem um papel-chave no Mal de Alzheimer".
"O cobre é um metal essencial e é claro que estes efeitos se devem à exposição durante um longo período", disse Deane no comunicado. "A chave será extrair o equilíbrio exato entre o consumo excessivo e escasso de cobre. Atualmente, não podemos dizer qual seria o nível certo, mas a dieta pode finalmente desempenhar um papel importante em regular o processo", acrescentou.
No entanto, outros especialistas que estudaram a relação entre o cobre e o mal de Alzheimer questionaram as descobertas do estudo. "Pesquisas incluindo a nossa mostram o contrário, que o cobre evita que a (proteína) amiloide forme o tipo de estrutura vista nas placas", afirmou Christopher Exley, professor de Química Bioinorgânica da Universidade Keele, em Staffordshire, na Inglaterra.
Exley e seus colegas publicaram recentemente seu último estudo sobre o tema na edição de fevereiro da revista científica britânica "Nature". "Acreditamos como grupo, com base no que sabemos, e nossa pesquisa foi feita com cérebros humanos e tecidos cerebrais, que o cobre protege contra o Alzheimer", afirmou.
"É preciso uma quantidade significativa de tecido para produzir resultados em que você tenha um grande nível de confiança. O sistema capilar de um camundongo é algo muito, muito pequeno", disse Exley à AFP.
Outro cientista, George Brewer, professor emérito de medicina interna da escola de medicina da Universidade de Michigan, disse que os "autores perderam um ponto importante sobre a toxicidade do cobre no cérebro".
"Eles não diferenciam o cobre transportado na água potável, como apresentado em seu estudo, do cobre encontrado na comida", afirmou Brewer em um e-mail enviado à AFP.
"Sempre tivemos cobre na comida, portanto esta não deve ser a causa desta nova epidemia de mal de Alzheimer", afirmou.
"Se eles tivessem vinculado este quantidade de cobre à comida, em vez de relacioná-la à água potável, não teria qualquer efeito", concluiu.